quarta-feira, 25 de setembro de 2013

A poética zangada.

Texto fresquinho, idealizado no ônibus (essa materialização da mobilidade do pensamento e da mobilidade no espaço, por vezes tão precário, por vezes tão caro e com o grande sonho de ser de uso livre) e criado graças à poesia diária do amar sem objeto, da filosofia, da música, da literatura, da amizade, sei lá do quê mais.


A poética zangada.
Imagine-se percorrendo o espaço, melhor, imagine-se percorrendo o céu, esta imensidão poética do espaço aberto. As possibilidades de enxergar tudo do alto sem perder o infinito dos detalhes, os cheiros e cores que advém do céu devem ser espetaculares. O cheiro amarelado da poeira urbana, o vento e suas curvas de lembranças e esquecimentos. São as golfadas de ar em meu corpo imensamente nu que nos farão lembrar do que ainda está sendo, do que ainda está acontecendo. A extensão do corpo não se perde no espaço aberto, sentimo-nos em intensidade, extensa intensidade, intensa extensão.

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Segunda-feira em três atos

Um poema, um pouco longo, que escrevi por volta dessa semana, em alguma madrugada.


Segunda-feira em três atos

- Ora, venha me explicar
porque desses olhos baços.
Respeito tua ressaca
mas nunca foi de amor
esse pranto fraco.
Soluça essa dor
que a tua voz eu não quero mais.
Vê se me conta do passado
porque já vi, não tenho espaço.

- Não fala assim.
Ouvi dizer que perdeu o par
e agora vem me marcar compasso?
Vê se esquece desse amor
que em tu só tu existe.
Afogue a si mesmo
e se deixa dissolver.
Eu só aceito
se deixar se perder.

- Chega disso, clandestina.
De inferno já estou farto.
Nem os astros sabem da sua sorte,
e não rio dos teus laços.
Vê se envereda em outro lado
que já me cansa esse fado.
Quero cantar rouco
e tu só me afinas.
Pra variar me deixa errar.

- Erra, mas vê se aprende!
De babaca já estou farta...
Teu caldo é desamor
e azeda meu orvalho.
Não me fala da saudade que sentiu...
Desembarca do meu corpo
e vê se embala a si mesmo
porque eu tô cansada de amar,
tô cansada de amar.

Não faça miséria
E não graceje com o coração doido.
Sofrimento não faz amor.
Se explora no meu corpo,
desse prazer eu também compadeço.
Se edifica em si pois
as flores que esqueci
o vento leva, mas quem sabe?
Amanhã é terça e o crisântemo sempre nasce.

domingo, 16 de junho de 2013

Domingo

Homenagem ao dia do descanso, posto que todo dia é o domingo de nós mesmos.

 domingo

os domingos me são opressores.
o tempo escorre sem a possibilidade
de nos agarrarmos a qualquer coisa.
fica essa coisa inerte
esperando pelo amanhã,
pelo quando,
pelo a fazer
pelo descanso.

não sou capaz de entender nada aos domingos.
tudo parece minúsculo frente a semana que virá.
todos os anos passam pelo domingo.
a saudade é o que fica,
é aquilo em que se insiste em lembrar.

é dos pessimistas o domingo,
é de tudo aquilo um saco,
é de tudo lido um asco,
é de tudo feito acaso.

aos domingos
não sou capaz de entender nada,
se nas palavras que falam não creio.

quinta-feira, 6 de junho de 2013

a perfeição é o mínimo

a perfeição é o mínimo.

A perfeição é o mínimo.
É tudo aquilo que me afasta;
um projeto inalcançável;
um modelo que me reprime.
É a letra com a qual me disperso.
São as palavras com as quais me exprimo
(ou com as quais tenho de me exprimir).
São as cores com as quais devo agradar.
Os atos, o gozo, o paladar
e por vezes o prazer medido,
contido, ao qual precisamos nos render.

A perfeição estava tangível.

Mas nem o mínimo se é alcançável
às vezes.
O máximo é o ser não contido.
O Futuro Imperfeito do meu tempo,
ao meu tempo.

quarta-feira, 29 de maio de 2013

Sorriso

Depois de exatos 6 meses sem postar nada é com nenhuma vergonha na cara que eu publico esse poema escrito há 10 minutos atrás (é a única forma de voltar a escrever, se não o poema seria engavetado numa pasta no meu pen drive ou mesmo deletado).

Sorriso.

São todos esses anos que me encurvam.
Foram todas as palavras ditas,
todas as palavras escutadas,
pensadas, caladas, arrancadas
que hoje pesam meu coração
e me calam de forma sútil.

Quem vê minha silhueta
é bem capaz de não reparar
no gosto amargo que ficou
do seu prato, do seu armário,
o cheiro ocre, azedo,
delicioso...

Amaldiçoo todas as maçãs que toco,
todas as rosas são espinhos,
todas as nuvens são de chuva,
toda linha reta é vazia.
Toda reza é já um depoimento.

Quem me vê assim taciturno,
talvez não veja o estrago,
talvez não queira ver mais nada.
Mas que perceba sempre que há,
em algum momento,
com algum sentido (pois em toda poesia
a última palavra deveria sempre
ser), um sorriso.